Uma vida dedicada missão


Após 13 anos a serviço das Pontifícias Obras Missionárias (POM) contribuindo em diversos trabalhos, padre Savio Corinaldesi, missionário xaveriano, encerrou suas funções na equipe nacional das POMs, no final de 2014. Ultimamente exercia a função de secretário nacional da Pontifícia Obra de São Pedro Apóstolo. O religioso de 78 anos voltou a Belém do Pará, sede da Região do Brasil Norte da sua Congregação. Padre Savio começou seu trabalho na sede das POM em 2002, como Secretário nacional da Infância e Adolescência Missionária (IAM).

Ordenado padre em 15 de outubro de 1961, seu primeiro campo de trabalho foi na Espanha, onde, por seis anos, atuou na Animação Missionária dos seminários a serviço das POM daquele país. Chegou ao Brasil em 1968 com o objetivo específico de viver e anunciar o Evangelho. Trabalhou por 34 anos nas dioceses de Belém e Abaetetuba (PA) e na prelazia do Xingu. De março de 1985 a junho de 1987, foi diretor do Centro de Formação Intercultural (Cenfi), em Brasília (DF). Mais tarde ocupou o cargo de superior dos Xaverianos da Amazônia e foi secretário executivo do Regional Norte 2 da CNBB.

Dono de um vasto conhecimento na dimensão teológico-missionária, padre Savio é profundo em suas reflexões. Com um estilo de vida simples, comunica a essência do Evangelho e tem sido de grande ajuda para a Equipe de coordenação das POM. Acompanhe a entrevista.

O que o senhor destacaria do trabalho realizado ao longo desses anos nas POM?
Desde que deixei o seminário da minha diocese onde me preparava para ser padre, convencido pelos “números” (minha diocese tinha 70 padres, para 41 paróquias em um território de 315 km2), sempre me deixei questionar pelas necessidades das igrejas mais pobres. As POM, que nasceram para o serviço a essas igrejas, realizariam plenamente meus sonhos. O Concílio Vaticano II tinha recordado que o anúncio do Evangelho até os confins do mundo é obrigação de todo cristão. Depois do Concílio, os papas continuaram a recordar sobre a necessidade do empenho missionário. Mais de 2000 anos depois da sua vinda ao mundo, 70% da humanidade ainda não ouviu falar de Jesus Cristo e de outros 30%, são 90% que precisam de uma nova evangelização. Saio das POM com certa sensação de fracasso.

Poderia nos explicar melhor essa sensação de frustração?
Em 1988, a CNBB, em sua 26ª Assembleia Geral publicou um excelente documento “Igreja, Comunhão e Missão”. Nele os bispos afirmavam: “As exigências do trabalho pastoral em nossas dioceses não nos dispensam da missão ad gentes. Antes, o envio missionário contribui para a renovação e vitalidade das Igrejas particulares”. (116) “... As missões ad gentes não são portanto, algo facultativo para a Igreja local, mas fazem parte constitutiva de sua responsabilidade” (117).
De 1988 para cá, o clero a serviço do povo brasileiro passou de 13.892 para 22.119 (em 2010). Um aumento de 59% que resulta ainda mais constrangedor quando comparado com o baixo número de missionários enviados além-fronteiras. A missão universal de fato foi por nós esquecida, mesmo diante do “aumento avassalador” dos recursos humanos, pastorais e financeiros.
Outro motivo que me faz sentir fracassado é o tipo de Igreja que somos. Meus primeiros anos de vida no Brasil me fizeram conhecer uma Igreja com uma clara opção preferencial pelos pobres, lutando pela justiça e pela libertação integral dos esquecidos e oprimidos, com suas Comunidades Eclesiais de Base, com sua leitura popular da Bíblia. Uma Igreja samaritana. Seria essa a contribuição específica da América-Latina ao mundo. Mas agora muita coisa mudou. Nossa Igreja esqueceu que deve ser samaritana. Voltou a prestigiar os sacerdotes e os levitas que rodeiam nossos altares e povoam nossos templos (Lc 10, 25-37). Uma Igreja de ritos, cultos, cerimônias, que nada tem a ver com Jesus Cristo.
Em um mundo que criou o café descafeinado, o cigarro sem nicotina, o leite desnatado... nós inventamos a “missão sem saída”, o “envio” sem destino. Uma missão que não se aproxima das vítimas por receio de sujar as mãos ou a barra da túnica. Uma missão descompromissada assim, não serve mesmo. Melhor não fazer.

Que mensagem teria para os leitores do SIM?
Nossa Igreja precisa se deixar avaliar pelos destinatários da missão. É a absolvição deles ou sua condenação que vai valer. Peço a Deus que o SIM seja sempre a voz deles, questionando-a e não a deixando sossegada. Estive por quase 13 anos nas POM. Tempo muito maior que o previsto, tempo suficiente para realizar sonhos. Por exemplo, o sonho de ver a Igreja do Brasil se tornando cada vez mais missionária. Lembro que logo nos primeiros dias pude ler, em uma revista da biblioteca, as palavras severas de dom Luciano Mendes de Almeida pronunciadas em um encontro de congregações missionárias:
“Os missionários estrangeiros foram verdadeiros missionários conosco, mas não nos ajudaram a sermos missionários... Pedimos aos missionários que nos ensinem também a nós a alegria da missão além-fronteiras”.

Qual a sua missão agora em Belém do Pará?
Jesus disse a Pedro: “Quando você era mais jovem, vestia-se e ia para onde queria; mas quando for velho, estenderá as mãos e outra pessoa o vestirá e o levará para onde você não deseja ir” (Jo 21,18). Meu presente e meu futuro estão nas mãos do meu parceiro, o Dr. Parkinson que vai tomando posse de mim, cada vez mais arrogante e exigente. Ele pensa que vai me ganhar, mas o coitado ignora que pertencemos a uma raça de pessoas que, pela graça de Deus, produz frutos também quando pregadas numa cruz. 

Publicado no Informativo SIM - Nº 01/2015
Leia o informativo completo no site das POM:

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