O jovem e a vocação

1. Introdução

Parece aos olhos de muitos um tema desafiador. Como falar de vocação aos adolescentes e jovens de hoje, marcados por características tão complexas e muitas vezes contraditórias a esse tema?

Vemos por um lado, um certo vazio e afastamento daquilo que é religioso e institucional mas, por outro lado, um número cada vez maior de jovens busca o sentido pleno da vida em experiências religiosas, grupos de jovens, movimentos de espiritualidade, religiões orientais e em outras formas de experiências fortes, grupos espontâneos, galeras, metaleiros, punks, pichadores, ecologistas, ambientalistas... E tantos outros.

É possível falar em vocação para os adolescentes e jovens, mas, antes de tudo, é preciso acreditar neles e libertar-se dos preconceitos. O jovem está inserido num contexto social e não é culpado de todas as acusações que lhes são imputadas.

2. Pressupostos

Vivemos na era pós-moderna caracterizada pela provisoriedade das relações, pelas emoções fortes, pela crise das instituições tradicionais (governo, família, religião), pela primazia das luzes, dos sons e cores, pela influência forte dos Meios de Comunicação Social que impõe modos e escravizam ao consumo desenfreado.

Outra grande característica de nossa época é a relativização dos valores. Para um grande número de jovens valor é aquilo que eles acham que é valor. É a teoria do "achismo", eu acho que isso é bom para mim, então eu faço. Pela influência da grande cidade e suas características desprezam-se valores que são universais: família, amor, religião, castidade, partilha, sensibilidade, mútua-ajuda.

O grande deus dos nossos dias é o prazer. Parece uma norma: em tudo o que faço tenho que ter prazer e levar vantagem. O erotismo e o sexo estão presentes em todas as relações na sociedade: compra e venda, conseguir um emprego, propagandas, maneiras de se vestir e relacionar. A sociedade prega que o sexo é normal em qualquer situação e estado de vida. "Se pintar uma ocasião e os interessados concordarem a transa acontece". Vemos crescer o abuso da sexualidade na adolescência e juventude, o homossexualismo, o lesbianismo e a bissexualidade pregados com a maior normalidade (novelas, filmes, revistas, propagandas, músicas).

Conta um ditado o seguinte: "A propaganda é a arte de fazer a gente comprar o que não precisa com o dinheiro que a gente não tem". Esse dito explica outra característica de hoje: o consumismo desenfreado. A televisão coloca em nossas casas uma infinidade de produtos, que muitas vezes são desnecessários. Eles entram primeiro via TV e depois, via supermercado, shopping, tornam-se realidade. A sociedade cria necessidades inexistentes antigamente. Com tantas "distrações": TV, SOM, VÍDEO, GAME, COMPUTADOR, INTERNET, ELETRODOMÉSTICOS, LIVROS, REVISTAS... sobra tempos para pensar na vida e no seu sentido?

Antigamente não havia muitas alternativas de divertimento. As pessoas se encontravam nas Igrejas, no campo de futebol, e nas festas tradicionais. Eram nesses lugares que as pessoas se relacionavam, rezavam compravam, vendiam, se divertiam, se conheciam, namoravam. Hoje as alternativas de lazer são fantásticas: cinema, TV, shows, parques, danceterias, boites... E com os modernos meios de locomoção, distâncias não mais existem (casa de campo, praia, estâncias...), nesse universo, a Igreja tornou-se uma opção a mais.

A distância que separa o universo cultural, do adolescente e jovem de um adulto é cada vez maior. Os pais não conseguem acompanhar a rapidez das transformações, da mudança de comportamento, de linguagem, de costumes, gostos, interesses e valores dos adolescentes e jovens. Uma pesquisa diz que um adolescente ou um jovem é totalmente diferente de um adolescente e jovem que chegue à mesma idade cinco anos depois (a cada cinco anos o comportamento do adolescente e jovem muda). Outro aspecto que devemos levar em conta é que o amadurecimento psicológico do jovem acontece cada vez mais tarde. Em outras palavras, a adolescência se prolonga muitas vezes até os 18 e 20 anos. Causas: excesso de protecionismo dos pais — recebem tudo pronto — não há sacrifício e nem luta pela sobrevivência. Essa constatação é mais notada na classe média e alta.

Outra característica marcante é o pluralismo religioso e o avanço da Nova Era. A busca de uma religião mágica que satisfaz as emoções e soluciona problemas imediatos. Uma religião sem compromisso. As Igrejas Pentecostais incentivam uma leitura fundamentalista da Bíblia, o anti-intelectualismo teológico, normas estritas e claras, leituras dualistas dos acontecimentos, confiança cega nos líderes, ênfase no emotivo e no festivo, compreensão do cristianismo centrado no indivíduo para satisfação das suas necessidades. O culto muitas vezes se limita à busca de favores; as igrejas são agências de serviço segundo as leis de mercado, não há formação de comunidade e sim formação de clientela, ocasionando uma alienação sócio-política dos seguidores e oportunismo político dos responsáveis.

Outro aspecto que devemos levar em conta é a crise de fé que todo adolescente passa no seu processo normal de amadurecimento. Esse fenômeno leva-os a se afastarem da Igreja e a ridicularizar o procedimento dos pais. Nessa fase é necessária muita compreensão e paciência.

3. Constatação

A busca do sentido da vida e o que fazer no futuro é uma constante na vida de cada jovem. Alguns preocupam-se com isso muito cedo, outros, por causa das influências citadas retardam esse processo, mas alguns, a minoria graças a Deus, não chegam a fazê-lo. O vazio é preenchido pela droga, álcool ou se atiram nos grupos radicais. A esses, é necessário trabalho psicológico profissional.

O trabalho da Pastoral Vocacional deve estar ligado com todas as outras pastorais para oferecer aos jovens um espaço de escuta daquilo que Deus tem para lhes falar.

4. Pistas

Pensar a Pastoral Vocacional urbana é tomar consciência do papel da Igreja na cidade: Qual a função da Igreja neste momento histórico que estamos vivendo? A resposta a este desafio vai dando identidade à Igreja e vai motivando jovens para uma resposta vocacional.

4.1 — Ser testemunhas da Ressurreição, mais que fiadores da instituição.

O povo está acostumado a olhar o bispo, padre, religioso(a) como detentores do poder, proprietários de instituições e manipuladores do saber. É preciso dar um passo decisivo na linha do esvaziamento para assumir uma postura moderna da nossa fé, fundamentada no seu núcleo central, que é a Ressurreição de Jesus.

A cidade questiona a institucionalização da fé, do rito, da celebração; porque não dá sentido à vida. O que dá sentido à vida são as opções subjetivas numa experiência fundante. O jovem se dispõe para o religioso, mas desconfia da instituição.

4.2— Busca de sentido vocacional.

O jovem busca um sentido vocacional a partir das opções grupais e pessoais. É a busca do sentido, que não se encontra nas instituições burocratizadas, mas nas experiências subjetivas. É necessário proporcionar experiências que vão dando sentido para a vida dos jovens no contexto da grande cidade. Na sociedade rural o sacerdote assume o papel de magia (benção para matar lagarta, rama para proteger da tempestade) na sociedade urbana o sacerdote deve ser o homem que dá sentido para a vida.

4.3— O jovem é um valor e quer se confirmar cada vez mais na sua identidade como um ser livre.

No contexto da modernidade é importante ajudar o jovem a perceber a diversidade dos valores da Igreja e da Sociedade e ajudá-lo no exercício da sua liberdade para uma opção consciente e madura. Por outro lado há a necessidade de garantir alguns valores cristãos, como instrumental de ajuda, para no exercício de sua liberdade, proporcionar um crescimento integral.

4.4 — O Trabalho Vocacional.

O trabalho vocacional luta contra uma perda cada vez maior da identidade da fé. Só é possível haver na Igreja vocação sacerdotal, religiosa ou leiga se houver educação da fé. Sem ela, podemos ter uma pastoral vocacional melhor organizada, mas fica o problema de fundo: a identidade e qualidade da fé, referencial indispensável da vocação.

4.5 — Retomada da Espiritualidade.

Face às mensagens religiosas que se apresentam agora e fazem das cidades imensos shopping centers religiosos em que todas as religiões do mundo se oferecem ao consumidor, a mercadoria católica é fraca. Das espiritualidades do passado parece que quase nada sobreviveu. O movimento que mais pegou, foi e é o movimento carismático: só isso já é um sinal claro de fraqueza da espiritualidade católica.

A pastoral vocacional é provocada a vivenciar uma espiritualidade, baseada principalmente na mística de Deus pastor: aquele que guia, alimenta, salva e é providência. É a espiritualidade do pastor e das ovelhas.

4.6 — Formação de grupos de vivência.

A característica desses grupos é que sejam constituídos por pessoas vivendo experiências semelhantes. Permitir que estes grupos de fé encontrem práticas concretas a partir de seus contextos de vida, e se disponham para experiências missionárias.

Através dos grupos de vivência é possível passar de uma motivação vocacional emocional para uma motivação de fé. O grupo vai vivenciando seu processo vocacional até uma opção definitiva.

4.7 — Relação personalizada.

O próprio Papa nos exorta para esta missão: "Descei para o meio de vossos jovens e chamai-os". É este estar junto que vai despertando vocações, que vai criando uma sintonia com aqueles que já vivenciam uma opção vocacional. Nesta convivência o padre vai se fazendo padre e o vocacionado vai entrando nesta sintonia a ponto de dizer: "este é meu padre", dispondo-se a seguir o mesmo caminho.

4.8 — Levar em conta o seguinte:

- Ir ao encontro do jovem onde ele está.

- Conhecê-lo nas suas dimensões: psicológica, sociológica e biológica.

- Escutá-lo respeitando seus valores e suas dificuldades, ajudando-o a superá-las.

- Estar aberto ao jovem, aprender com ele.

- Proporcionar momentos fortes de lazer, estudo, reflexão, oração, dias de convivência, retiro...

- Organizar encontros de orientação vocacional para que os jovens possam discernir qual é sua vocação.

- Desarmar-se dos preconceitos e acreditar no jovem.

- Ajudá-lo a orar e a ler a Palavra de Deus.

Pe. Carlos Alberto Chiquim

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